quinta-feira, 20 de setembro de 2012

As duas espadas


Não é necessário assobiar


Não é necessário assobiar
para estar só,
para viver às escuras.

Em plena multidão, em pleno céu,
recordamos a nós mesmos,
ao íntimo, ao nu,
ao único que sabe como crescem suas unhas,
que sabe como se faz seu silêncio
e suas pobres palavras.
Há Pedro para todos,
luzes, satisfatórias Berenices,
mas, dentro,
debaixo da idade e da roupa,
ainda não temos nome,
somos de outra maneira.
Não só por dormir os olhos se fecharam
mas para não ver o mesmo céu.
Nos cansamos de repente
e como se tangessem o sino
para entrar ao colégio,
regressamos à pétala escondida,
ao osso, à raiz semi-secreta
e ali, de repente, somos,
somos aquele puro e esquecido,
somos o verdadeiro
entre os quatro muros de nossa única pele,
entre as duas espadas de viver e morrer.

(Pablo Neruda - Memorial de Ilha Negra)

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